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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

A VIOLÊNCIA E OS JOVENS QUE NÃO ESTÃO NA ESCOLA


Fala-se muito em diminuir a maioridade penal, mas a verdadeira questão que se coloca para o país é aumentar a ''maioridade educacional''

Crimes brutais envolvendo jovens, sua repercussão na mídia e as discussões no Congresso mostram, há semanas, nossa sociedade se preparando para se proteger de seus jovens, não para protegê-los. Aceita-se com naturalidade um mundo em que criança não é esperança, é problema. Se parece exagero, conto três episódios que vivi recentemente:

Terça-feira, 13 horas, restaurante universitário. Um colega diz: "Não importa a idade. Envolveu-se em crime? Cadeia!" Outro responde: "Vai se aperfeiçoar no crime, nas cadeias que temos..." O primeiro replica: "Será mais negócio mandar pras escolas que temos?" Afasto-me. Se cadeia e escola não são "negócio", nessa conversa entre acadêmicos alguém pode chegar a propor a pena capital...

Quinta-feira, 16 horas, rua de comércio. Dormindo na calçada, um menino "atrapalhando o tráfego". Tento falar com ele e alguém me adverte: "Não perca tempo. Ele tá chapadão de crack!" Pergunto: "Um policial não poderia levá-lo a um hospital?" O comerciante responde: "Passou um agorinha e nem ligou. Tem dúzias deles largados assim aqui, no centro". Sigo em frente, buscando conserto para um velho computador...

Sexta-feira, 18h30, semáforo. Só vejo as mãos dela, vendendo balas. A cabeça não alcança o vidro do carro. Lembro da notícia do bebê abandonado, mas penso que, se a criança já sabe andar na rua, isso não nos choca nem é notícia. Abre o sinal e sigo. Pelo retrovisor, vejo a menina driblando os automóveis...

Bertolt Brecht, em seu teatro pedagógico, propõe que não nos emocionemos, mas pensemos. Só que aqui nem é teatro. Sou eu, cúmplice dessa cidade que abandona suas crias. O Brasil não é só isso, e sei de muitos lugares que nem fazem idéia do inferno das metrópoles, mas as notícias envolvem todos e discutir as soluções também. Discutamos, pois.

No debate sobre se é mais barato prevenir ou remediar, ouve-se que cada presidiário custa por mês mais do que dez alunos na escola e que cada menor infrator confinado custa mais do que 20 crianças na escola. E se cadeia não adianta e preso é tão caro, há quem diga que pena de morte barateia... Não é preciso ser jurista para se chocar. Todos sabemos que preso é responsabilidade do Estado, a qualquer custo. Mas criança na escola não é responsabilidade do Estado? E a que custo? Um décimo do que gastamos com os presos e um vigésimo do que custa um infrator?

Há milhões de jovens sem trabalho, escola e vida social decentes - entre eles, milhares de crianças de rua e outras tantas viciadas, prostituídas ou envolvidas com a contravenção e o crime. Cuidar desses últimos é essencial, mas sem solução para os demais equivale a enxugar gelo... Como é impossível arranjar de repente ocupação para milhões (ainda mais milhões que não completaram a escola básica), mais urgente do que discutir a maioridade penal é aumentar a maioridade educacional, com formação geral ou profissional mais vida cultural, música, esportes etc.

Porém quem cuidará disso? Assim como para evitar crimes as leis são importantes, mas não bastam, é preciso olhar cada criança como responsabilidade nossa e "desnaturalizar" a miséria. Se no lugar do menino largado na rua estivesse eu caído, com óculos e computador portátil, em minutos seria socorrido. Mas um menino drogado, descalço, traz menos riscos dormindo no chão do que em pé... Como aconselha Brecht, não é para se emocionar, é para pensar.



"Nossa sociedade está se preparando para se proteger de seus jovens, não para protegê-los. Como disse Brecht, não é de emocionar, é para pensar"

LUIS CARLOS DE MENEZES é físico e educador da Universidade de São Paulo e sabe que não se resolve a violência só com Educação, mas que sem Educação não se resolve nada.

Fonte: revistaescola.abril.com.br

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