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segunda-feira, 1 de março de 2010

POR QUE AS MÃES QUEREM DEIXAR O EMPREGO PARA FICAR COM OS FILHOS


As mulheres conquistaram espaço no mercado de trabalho por um preço alto. Agora elas estão recuperando o direito de dedicar-se à família sem culpa

Por Celso Masson, Martha Mendonça e Solange Azevedo
A paulistana Luciana Zerwes Tremblay, de 34 anos, trabalhava das 9 horas às 18 horas na empresa de distribuição de medicamentos da qual é sócia. Há nove meses, ela abandonou o escritório. Faltavam cerca de 30 dias para o nascimento de Brian, seu terceiro filho. Luciana pretendia voltar à ativa depois de cumprir a licença-maternidade. Aos poucos, mudou de idéia. "Deixar o trabalho foi uma decisão difícil. Passei meses pensando nisso até perceber que, com três filhos pequenos, ficaria complicado conciliar carreira e maternidade", afirma. Além de Brian, Luciana tem os gêmeos Kevin e Clara, hoje com 2 anos e 3 meses. "Quando eles nasceram, tentei me dividir, ficando na empresa meio período. Mas vi que assim não cuidava deles nem trabalhava direito." A escolha de Luciana está longe de ser uma exceção. Mais de metade das brasileiras que têm filhos e trabalham fora gostaria de largar o emprego e passar todo o tempo com as crianças, segundo a pesquisa Mães Contemporâneas/2006, do Ibope. Nos Estados Unidos, a nação onde as batalhas feministas mais influenciaram as relações de trabalho no mundo, a taxa de mães com emprego sofreu uma reversão. Durante 22 anos, o número de mães que trabalham fora cresceu. A partir de 1998, passou a cair. Em 2005, 5,6 milhões de mães americanas deixaram o emprego para cuidar dos filhos - 1,2 milhão a mais que dez anos antes.

O que está mudando? Há apenas duas décadas, no Brasil, a entrada maciça de mulheres no mundo do trabalho transformou radicalmente a economia. O principal motivo foi a necessidade: a crise econômica da década de 80 empurrou as mulheres para o trabalho. Mas a cultura já havia sofrido uma revolução. Elas passaram a encarar a realização profissional como um direito. E a família tinha de ser repensada. O que parece estar ocorrendo agora é uma nova reviravolta na escala de valores da sociedade.

"Ficar em casa cuidando das crianças virou um novo símbolo de status", afirmam Kellyanne Conway e Celinda Lake no livro What Women Really Want (O Que as Mulheres Realmente Querem), ainda sem tradução no Brasil. Nos anos 80 e 90, caracterizados pelo individualismo e pela competição profissional acirrada, era normal sacrificar a vida pessoal em prol do sucesso - ou aquilo que se considerava sucesso. Nesse modelo competitivo, a busca por resultados tem elevado a carga de trabalho nas empresas e, conseqüentemente, o estresse. Daí começou a ganhar força o discurso oposto, que mistura ecologia, espiritualismo e bem-estar. As mulheres, ainda a meio caminho da plena conquista da igualdade, começaram a se perguntar se ela vale a pena.

O outro lado da equação entre maternidade e vida profissional são os filhos. Até há pouco, falava-se no "tempo qualitativo" que as mães passavam com eles. Esse conceito vem sendo destroçado. "Isso era uma desculpa. Não existe qualidade sem um mínimo de quantidade de tempo, de conexão, de acompanhamento da rotina", diz a terapeuta de família Daniela da Rocha Peres, de São Paulo. "Vejo no meu consultório muitas mães executivas que abrem mão de todo s o tempo com os filhos e depois não sabem por que eles estão com problemas. É muito cruel ver mães que nunca levam ou buscam seus filhos na escola, que não conhecem seus amiguinhos, suas questões do dia-a-dia." Hoje há um consenso entre os psicólogos: a presença da mãe na vida dos filhos é imprescindível. "Estamos num momento de transição dos modelos de mãe - e também de pai", diz Daniela. "Toda a família se desestrutura quando cada um está no seu trabalho e as crianças estão totalmente terceirizadas. E não podemos ser moralistas e jogar tudo isso no colo das mães só porque historicamente é assim que vem sendo feito. Os pais também precisam participar dessa rotina."

‘‘Eu chegava em casa depois das 11 da noite. Meu filho estava dormindo havia horas. Eu morria de culpa’’ MÁRCIA ALVES, 36, contadora

O sentimento de perda no âmbito familiar já está produzindo efeitos no mundo do trabalho. "Há mais gente hoje falando sobre uma maior dedicação à maternidade", diz a consultora de carreira paulista Vicky Bloch. "Muitas mulheres jovens planejam ficar um pouco mais em casa quando os filhos nascerem, para só depois retomar a carreira." Até há bem pouco tempo, a decisão de trocar a carreira pela dedicação exclusiva à família era percebida como sinal de derrota ou como atestado de despreparo profissional. O que se esperava das mulheres é que fossem bem-sucedidas na carreira e conseguissem, ainda, administrar com perfeição o lar e o tempo com as crianças. A mãe que em nome dos filhos desistisse do trabalho passava por desocupada. A carioca Cátia Moraes sentiu isso na pele. Em 2001, ela escreveu Absolvendo a Cinderela (Editora Mauad). O livro mostra como viviam as mulheres que optavam por ser donas de casa e o preconceito que elas enfrentavam. "Fui muito criticada em chats, recebi dezenas de e-mails me condenando, mas sempre deixei claro: o que eu defendo é a liberdade de opção", diz Cátia. "Descobri que eu me realizava muito na função de mãe, de acompanhar a vida da minha filha. E garanto que existe, sim, vida inteligente em mães de porta de escola."

Apenas seis anos depois de Cátia, a administradora de empresas Luciana Zerwes Tremblay fez a mesma escolha. A reação das amigas foi completamente diferente. Nenhuma seguiu o exemplo, mas todas a apoiaram. E sua mãe passou a lhe dar uma mesada. "Estou feliz porque a infância dos meus filhos jamais voltará. Daqui a alguns anos posso voltar a trabalhar, e fazer isso pelo resto da minha vida", diz Luciana.


VOLTA DIFÍCIL
Para cuidar de Maurício, de 11 anos, e Mariana, de 7, Márcia saiu do emprego. Quando tentou voltar ao mercado, estava defasada


Nem sempre essas escolhas dão tão certo. Muitas vezes, o que começa como uma opção temporária - cuidar dos filhos enquanto eles são pequenos - afeta todo o futuro profissional. A carioca Márcia Alves, de 36 anos, é um exemplo. s Formada em Contabilidade e com um emprego que durava dez anos, ela permaneceu em casa as 16 semanas regulamentares da licença-maternidade. Quando retornou à rotina intensa do trabalho, às vezes era obrigada a cumprir jornadas superiores a 12 horas por dia. "Eu chegava em casa depois das 11 horas da noite. Meu filho já estava dormindo havia muito tempo. Morria de culpa." Ela também fazia plantões nos fins de semana e, devido a uma expansão da empresa, teria de viajar constantemente para São Paulo, ficando mais tempo longe dos filhos. "Quando eu estava no emprego, imaginava como seria bom ter tempo para mim. Hoje, em casa, fico pensando aonde teria chegado se continuasse trabalhando. Não digo que jamais voltarei. A questão é que, quanto maior o tempo afastada, piores as condições." Ao procurar emprego, Márcia percebeu que teria mais despesas do que seria capaz de suportar com os salários que eram oferecidos. "Eu precisaria de mais uma empregada e gastaria com transporte para as crianças. Nunca valia a pena."



TRÊS É DEMAIS
Mesmo com os gêmeos Kevin e Clara, de 2 anos, Luciana continuou na empresa. A chegada de Brian mudou os planos

O que a contadora enfrentou costuma ser a norma. "Empregadores realmente não querem contratar mulheres que ficaram um tempo paradas", diz Leslie Bennetts, autora do livro The Feminine Mistake (O Erro Feminino) e editora da revista Vanity Fair. "O mercado entende que as pessoas que interrompem a carreira não são habilitadas e estão desatualizadas. Chefes querem atrair quem tenha um currículo consistente. Muitas mulheres sofrem com a dificuldade de se recolocar no mercado." Em alguns casos, recomeçar a partir de um patamar mais baixo pode ser vantajoso no longo prazo, sobretudo no caso de profissionais capacitadas, que podem recuperar o tempo perdido e voltar a ascender na carreira. Mas nem sempre é assim. As mulheres que retrocedem no campo profissional podem se sentir isoladas, entediadas e cair em depressão.

‘‘Meu trabalho, daqui a alguns anos, eu posso retomar. A infância dos meus filhos jamais voltará ’’ LUCIANA TREMBLAY, 34, administradora de empresas

Para complicar ainda mais a escolha, a corrente de defensores do trabalho feminino, nos Estados Unidos, passou a usar um novo argumento. Não se trata, segundo ela, de uma opção entre carreira e família. A própria segurança familiar é que estaria em jogo quando a mulher desiste de sua profissão. "É um erro a mulher abandonar sua carreira", diz Leslie Bennetts, autora de Feminine Mistake. "Quando ela perde a independência financeira, fica mais vulnerável a muitos riscos." Não se trata apenas do divórcio, que faz o padrão de vida das crianças cair. O marido pode morrer. Ou ser demitido. "É crucial a mulher se manter auto-suficiente economicamente", diz Leslie. "Assim pode garantir a qualidade de vida dela própria e dos filhos."

"Há muitos elementos que compõem o preço da maternidade", diz Ann Crittenden, autora dos livros If You’ve Raised Kids, You Can Manage Anything (Se Você Criou Filhos, Pode Gerenciar Qualquer Coisa) e The Price of Motherhood (O Preço da Maternidade). Segundo ela, a dificuldade de deixar o trabalho e retornar mais tarde poderia ser contornada caso o mercado fosse mais flexível. "Empregadores simplesmente não querem contratar mulheres com filhos pequenos. Isso deveria ser contra a lei", afirma. Para ela, conciliar carreira e maternidade é mais difícil para mulheres que não ocupam altas posições, que não têm poder de barganha e por isso podem ser demitidas sem grandes transtornos para a empresa. "Os empregadores deveriam encarar a maternidade como algo natural. E enxergar que as mulheres querem ter uma vida profissional, não apenas a familiar", diz Ann Crittenden.

Segundo um levantamento do site americano Salary.com, caso fosse remunerada por todas as horas que trabalha, uma dona de casa nos Estados Unidos deveria receber anualmente US$ 134 mil, algo como R$ 22 mil por mês. O cálculo leva em conta o número de horas dedicado a tarefas como arrumar a casa, cozinhar, s cuidar dos filhos e gerenciar a economia doméstica. Na conta desse salário, foi atribuído um valor para a função de executiva do lar. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, nos países que calculam o serviço das donas de casa como parte da produção de riquezas, ele corresponde a espantosos 60% do PIB. Isso explica, em parte, por que o número de mulheres que trabalham fora vem caindo nos EUA.

Dados do IBGE mostram que a remuneração feminina é 30% inferior à dos homens que ocupam cargos equivalentes. Além disso, a informalidade é maior entre as mulheres. Isso significa que elas não contam sequer com benefícios como a licença-maternidade. A depreciação do trabalho feminino é atribuída a um conjunto de fatores. Embora não admitam abertamente, muitas empresas pagam menos às mulheres pressupondo que elas terão menor comprometimento com o trabalho quando surgirem demandas familiares. Em muitos casos, mães nem são contratadas. Atualmente, uma mulher americana de 30 anos sem filhos ganha o equivalente a 90% do salário de um homem. As que são mães ganham apenas 70%, mesmo com idade e formação equivalentes. Uma explicação para a diferença salarial poderia ser que as mães de família se concentram menos no trabalho e, portanto, produzem menos. Mas isso é falso. Vários estudos concluíram que as mulheres são mais produtivas que os homens.
Os dilemas da dona de casa

Largar o emprego envolve mais que perder uma fonte de renda. Especialistas dizem o que se deve levar em conta

Como agir quando alguém mostrar preconceito em relação a sua decisão de voltar para casa?

Muitas pessoas - as próprias mulheres, principalmente - se surpreendem negativamente ao saber que uma mulher deixou o trabalho para se dedicar à casa e à família. O ideal é não responder. Fingir que não ouviu ou não entendeu muitas vezes dribla situações estressantes. Se responder alguma coisa for inevitável, pode-se manter o foco na máxima segundo a qual todos têm liberdade para decidir seus rumos. Se foi derrubado um dia o preconceito contra as primeiras mulheres que foram à luta nas ruas, que se derrube também agora o preconceito contra as que optam pela casa.

Estar de volta ao mundo doméstico significa ter de arcar com todas as tarefas do lar?

De modo algum. A idéia de dividir tarefas e responsabilidades (práticas e de decisão) com o marido continua. Claro que, se ele trabalha e a mulher não, ela cuidará de mais coisas. Mas uma casa não é um hotel. O homem deve fazer parte - e as crianças também - de uma divisão justa dessas tarefas.

Você passou muito tempo fora e perdeu o controle de sua casa. O que fazer?

Um grupo inteiro terá de se adaptar à nova rotina. Isso inclui mulher, marido, filhos, empregados domésticos e até mãe e sogra, caso elas tenham sido a tábua de salvação por bastante tempo. A palavra de ordem é: a dona da casa está de volta. Não importa se algo era feito de forma X quando a mulher não estava. Agora ela está em casa e tem o direito de que as coisas sejam feitas a sua maneira. Tudo com o máximo de jeito, é claro. O importante é não ser visita na própria casa.

Qual o risco de interromper a carreira por dois ou três anos?

É possível retomá-la no mesmo patamar, com uma remuneração equivalente? Depende da idade, da área profissional, do nível de formação e da experiência anterior. Mas a resposta é: não será fácil. Ficar longe dois ou três anos, na maioria dos casos, é afastar-se da prática profissional e dos avanços tecnológicos. Se surgir uma oportunidade, provavelmente a remuneração não será equivalente ao momento em que a mulher parou. Uma dica: quem quer mesmo voltar deve aceitar recomeçar por um pouco menos. Qualquer porta de entrada pode ser importante.

Quando os filhos crescerem, a mãe corre o risco de sentir-se inútil em casa?

Se as crianças foram o único foco real por anos, é natural que haja um vazio depois que elas crescerem e se tornarem mais independentes. Não se devem jogar essas frustrações em cima delas, tentando manter a interferência em suas vidas. Quando a mãe manteve atividades e interesses ao longo desse tempo, será mais fácil intensificá-los para compensar a "perda" dos filhos. Mesmo que não tenha mantido outros interesses, nunca é tarde para buscar algo que lhe dê prazer.

Até a Segunda Guerra Mundial, quando ingressou de forma sistemática no mercado de trabalho no mundo, a mulher enfrentava uma discriminação acintosa. As ocupações oferecidas nas empresas não exigiam formação superior. As vagas eram de secretária, telefonista, atendente, em geral ocupadas por solteiras. A guerra, que exigiu a entrada de milhões de mulheres em todo tipo de ocupação, abriu espaço para o discurso da emancipação, popularizado por Betty Friedan nos anos 60, auge do movimento feminista. Friedan legitimou a contribuição da mulher no mundo do trabalho em livros como The Feminine Mystique (A Mística Feminina, título que serviu de inspiração para o trocadilho do livro The Feminine Mistake, lançado por Leslie Bennetts em abril). Para ela, a ascensão profissional da mulher era a condição fundamental para conquistar direitos iguais. "Do ponto de vista social, é muito melhor as mães terem renda", diz Ann Crittenden. Essa visão, que era revolucionária 40 anos atrás, fez brotar o sentimento oposto: o preconceito que antes havia em relação à mulher trabalhadora voltou-se contra a que permanecia na condição de dona de casa.

"Nenhuma geração anterior viveu como as mulheres de hoje. Elas têm novos interesses, aptidões, sensibilidade e enfrentam maiores desafios", diz Shoshana Zuboff, professora da Harvard Business School e autora de O Novo Jogo dos Negócios (Campus/Elsevier). As mulheres hoje são educadas, viajadas e informadas como nunca foram. Participam de todas as dimensões da vida. Nem por isso o mundo se adaptou totalmente às necessidades femininas. "Se você olhar atentamente as políticas de recursos humanos das empresas, vai perceber que estão construídas de acordo com o ciclo de vida dos homens. Milhões de mulheres no mundo que passaram a trabalhar e tocar sua carreira descobriram-se aprisionadas em um sistema de gerenciamento construído para o sexo oposto."

‘‘Eu faço meus horários, tenho tempo para ajudar as meninas nos estudos. Vivo o melhor dos mundos’’ ROSE CAMPIANI, 50, publicitária

Uma das premissas do modelo masculino de gestão é que o trabalhador deve colocar seu tempo à disposição da empresa de maneira contínua. "Mães que tentam trabalhar meio período não são levadas a sério. São punidas por não estarem por perto e perdem oportunidades", diz Shoshana. Para Leslie Bennetts, pesquisas mostram que muitas mulheres deixam a carreira porque o mercado de trabalho é inflexível. "As empresas estão estruturadas de uma forma em que é difícil para a mulher conciliar carreira e família." A solução, segundo as estudiosas do assunto, é criar a própria alternativa. "As mulheres têm de usar a criatividade, procurar atividades que sejam compensadoras do ponto de vista financeiro e da realização pessoal", afirma Shoshana.

Foi isso que fez a publicitária paulistana Rose Campiani, de 50 anos. Até 2004, ela era vice-presidente de mídia da agência Publicis Norton. Em uma fusão com outra empresa, Rose foi dispensada. Por mais de duas décadas, sua rotina havia sido de reuniões, viagens, fins de semana trabalhando, compromissos à noite, cursos. A adaptação à vida doméstica não foi fácil. As próprias filhas, ela diz, estranharam sua presença. "Tivemos conflitos. Muitas vezes me senti uma intrusa." Rose saiu da empresa, mas não parou de trabalhar. Ela hoje dá consultoria na área de publicidade e desenvolve o projeto de um programa para a televisão. "Quem trabalhou tanto tempo como eu não consegue ficar parado. Eu faço meu horário, tenho tempo para minhas caminhadas, para ajudar as meninas nos estudos. E também consigo encontrar os amigos, coisa que me fazia grande falta. Agora, eu vivo o melhor dos mundos." A situação de Rose, no entanto, é rara. Seu marido é empresário e ganha muito bem. Além disso, ela recebeu uma boa indenização quando foi demitida, e sua atividade de consultora lhe dá uma remuneração satisfatória.

O desequilíbrio entre a vida profissional e a familiar não é um problema exclusivo das mães. As estatísticas mostram que homens também estão buscando mais flexibilidade no trabalho. Na maioria dos casos, as horas a menos no escritório são usadas com a família. "Para que a mulher consiga conciliar carreira e trabalho, é crucial que o marido participe ativamente da criação dos filhos e compartilhe as tarefas domésticas", diz Leslie Bennetts. Em alguns países da Europa, a licença-maternidade já é considerada como direito do casal, não apenas da mãe. Na Suécia, o período de afastamento, de 68 semanas, pode ser dividido entre a mãe e o pai. Na Dinamarca, a licença é de dois anos para a mãe ou de um ano para o casal. Hoje, o marido não só é chamado a assumir responsabilidades dentro de casa, como faz questão de exercer esse papel.


NOVA CARREIRA
Laura deixou o emprego para se dedicar às filhas Nina, de 11 anos, e Gabriela, de 8. Hoje, é professora e faz doutorado

Os pais também evoluíram. Mas, se o homem sai do trabalho para levar o filho ao médico, acham que a mulher morreu’’ LAURA GUIMARÃES, 37, redatora do programa Mothern

Mas o peso da decisão entre carreira e família recai principalmente sobre as mulheres. É uma decisão difícil porque inclui desejos contraditórios. A mesma pesquisa que revela que a maioria das brasileiras tem vontade de largar o emprego para cuidar dos filhos mostra que 90% delas trabalham porque querem atingir a realização pessoal. A escolha exige um profundo questionamento sobre o que é sucesso, felicidade e até sobre o significado de ter filhos.

O apelo biológico

Segundo pesquisa do Ibope, mais da metade das mães que trabalham gostaria de se dedicar apenas aos filhos

No Brasil, 51% das mulheres são mães. Para 68%delas, é difícil conciliar trabalho, maternidade e casamento.

Do total de mães trabalhadoras, mais de metade delas são empregadas e... 34% estão presentes no setor informal, 41% são autônomas e 4% sSão donas do próprio negócio. 84% das mães que trabalham acham que a casa é
"o melhor lugar do mundo"


Dispensadas

Revertendo uma tendência que se mantinha havia 22 anos, as mães perderam espaço nas empresas americanas

Nos Estados Unidos, a participação no mercado de trabalho de mulheres casadas com filhos de até 1 ano caiu 7% entre 1998 e 2004

Trabalhar 14 horas por dia não é saudável. Nem para as mães nem para os pais

Em nome dos filhos

Trabalhar 14 horas por dia não é saudável. Nem para as mães nem para os pais

RUTH DE AQUINO

Tenho dois filhos já criados. O primeiro quase nasceu numa redação de jornal. O segundo quase nasceu na praia. São de dois ex-maridos. Nunca passou pela minha cabeça deixar de trabalhar para ser mãe em tempo integral. Tampouco cogitei não ter filhos para me dedicar à profissão. Ser mãe e jornalista eram dois desejos profundos. E não se excluíam. Muitas vezes dei, temporariamente, mais peso ou à maternidade, ou à carreira. Quando engravidei pela primeira vez, me senti meio culpada porque ia sobrecarregar os colegas do jornal. Também sentia culpa quando faltava a aniversários dos filhos. O motivo era uma reportagem ou o mestrado em outro continente. Mas não me arrependo de nada. Aprendemos a não dar valor excessivo a datas. Sempre que eu estava fora do Brasil, cada filho morava com seu pai.

Houve um momento crítico, quando fui executiva num jornal diário no Rio de Janeiro. De segunda a sexta-feira, não fazia nenhuma refeição com meus filhos adolescentes. E, como eu era separada, eles comiam sozinhos. O mais velho, então com 17 anos, reclamou: "Não consigo falar com você, só com a secretária, você está sempre em reunião ou ocupada. E não estamos conseguindo tempo nem calma para conversar". Chorei e dei razão a eles. Passei a delegar ao editor-chefe os últimos detalhes, para chegar em casa a tempo de jantar em família.

Meus filhos jamais se queixaram de minhas viagens. E foram muitas. Depois de eles nascerem, vivi oito anos - não consecutivos - no exterior, ora em cursos, ora como correspondente. Todas as opções foram exercitadas. Levei o filho bebê, deixei o maior com o pai. Deixei os dois filhos, cada um com seu pai, viajei com o namorado. Matar a saudade exigia malabarismos. Eles iam passar férias comigo na Europa. Eu arrumava umas passagens baratas, promocionais, para visitá-los no Brasil. Fizemos viagens só nós três, fomos parceiros de aventuras radicais. Uma vez perguntaram a meu filho mais velho como me definiria, e ele respondeu: "Uma pessoa com incrível capacidade de tentar ser feliz".

Trabalhar 14 horas por dia num escritório ou numa empresa não me parece saudável nem para pais nem para mães. Se você tem o privilégio de amar o que faz, de alguma maneira você trabalha o tempo todo. Em conversas, em festas, em casa. E mesmo em sonhos. Trabalho e prazer podem ser sinônimos. O que prejudica as relações - com companheiros, filhos e amigos - é a dedicação operacional e quase exclusiva a uma função que nos afaste do ócio produtivo, do laz er cultural, do contato com nossos pensamentos. Até o desempenho profissional sofre. Época Negócios publicou uma bela reportagem sobre a infelicidade crônica de executivos que ainda cultivam um estilo workaholic.

A boa nova é que os homens também querem dar mais atenção aos filhos. Conversei com amigos, de 35 a 55 anos, antes de escrever este depoimento. Separados e casados, com filhos. A maioria já desistiu de promoção ou mestrado no exterior; já recusou oferta de emprego numa outra cidade ou já faltou ao trabalho; já saiu de workshop importante antes de acabar. Tudo em nome dos filhos. Ou da própria satisfação como pais.

Não me senti prejudicada na carreira por ser mãe. Após cada licença-maternidade, eu voltava ao trabalho com mais vontade de fazer coisas novas. Teria educado pior os meus filhos se tivesse parado de produzir, de criar. Seria uma pessoa frustrada, e cobraria isso lá adiante. Meus filhos odiariam uma mãe controlando o tempo todo. Ninguém precisa de ninguém em tempo integral. Meus ex-maridos odiariam ter de me sustentar. Não consigo entender este dilema: trabalho ou família. Para mim, é um não-dilema.


Mais maduras

Um estudo da Comissão por Oportunidades Iguais, da Inglaterra, chegou a uma conclusão otimista
Mulheres que tiveram filhos depois dos 30 anos têm maior poder de barganha nas empresas

A licença maternidade no mundo

O período longe do trabalho varia de país para país. Na Dinamarca, os pais podem permanecer até um ano com os filhos depois do parto

Argentina

13 semanas com 60% da remuneração para a mãe

Brasil

16 semanas de licença remunerada para a mãe, com direito a um adicional de 15 dias para amamentação. Em cerca de 40 municípios, incluindo capitais como Fortaleza, Teresina e São Luís, leis locais garantem 180 dias de licença

Canadá

15 semanas com 55% da remuneração, com a opção de um adicional de 37 semanas sem remuneração

Dinamarca

Dois anos de licença remunerada para a mãe ou um ano para o casal

Estados Unidos

A critério do empregador. Fundos mantidos por entidades de classe garantem o salário da mãe por até quatro meses

França

16 semanas com 84% da remuneração para a mãe

Inglaterra

26 semanas de licença remunerada para a mãe, que pode ser prorrogada para até um ano - nesse caso, sem remuneração

México

12 semanas de licença remunerada para a mãe

Suécia

68 semanas a serem divididas entre mãe e pai. O pai pode ceder até 25 semanas para a mãe

Fonte: revistaepoca.globo.com



Nota pessoal: Assim que engravidei de meu primeiro filho abri mão de minha vida profissional e me dediquei apenas a ele e logo depois engravidei do meu segundo filho.
Aí não teve mesmo jeito. Dediquei todo meu tempo a famnilia. Não me arrependo. Hoje sei que valeu a pena cada segundo que passei ao lado deles, pois são meu orgulho.Foram crianças bem educadas, bom alunos,bom filhos,hoje ainda estudantes de direito, os dois. Mas já fazem estágio, já estão encaminhados na vida. Fiz minha escolha coloquei meus filhos e marido em primeiro lugar dando a eles o que tenho de melhor o meu amor e dedicação. Sei que não posso cobrar nada deles, pois foi uma escolha minha. Nem posso exigir nenhum reconhecimento da parte deles. Mas é uma decisão dificil a tomar.

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